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US Quiz of the Month – January 2012

CASE REPORT

Doente de sexo masculino, 69 anos de idade, com história de cardiopatia isquémica e insuficiência cardíaca congestiva, foi orientado para realização de endoscopia digestiva alta (EDA) por anemia ferropénica. A EDA revelou um abaulamento da mucosa da segunda porção duodenal, compatível com uma lesão subepitelial com cerca de 15 mm (Imagem 1).

Imagem 1 – Lesão subepitelial da segunda porção do duodeno

 

Realizou-se uma ecoendoscopia que evidenciou uma lesão da submucosa, bem delimitada, globalmente hipoecóica mas algo heterogénea com focos de hiperecogenecidade, sem envolvimento aparente da muscular própria (Imagem 2).

Imagem 2 – Ecoendoscopia radial evidenciando uma lesão da submucosa

 

Procedeu-se a punção da lesão guiada por ecoendoscopia com obtenção de material para citologia e microhistologia. A avaliação histopatológica evidenciou ninhos sólidos de células uniformes, células estas positivas na avaliação imunohistoquímica para a cromogranina A e para a somatostatina. O doente não apresentava história sugestiva de neurofibromatose nem clínica de síndrome de somatostatinoma. A TC abdominal não evidenciou qualquer lesão e o octreoscan não mostrou outros focos de hipercaptação para além da segunda porção duodenal. Os níveis séricos dos marcadores de tumores neuroendócrinos estavam todos dentro do normal. Estabeleceu-se o diagnóstico de somatostatinoma duodenal primário, sem evidência de metastização ganglionar ou à distância.

Após explicadas as opções terapêuticas e os riscos das mesmas ao doente, este recusou a opção cirúrgica. Tendo em conta as comorbilidades do doente assim como a as características imagiológicas da lesão, optou-se por avançar para a ressecção endoscópica da lesão. Procedeu-se então a exérese da lesão pela técnica de dissecção da submucosa, conseguindo-se uma ressecção em bloco da totalidade da lesão (R0) (Imagem 3 e 4).

Imagem 3 – Dissecção submucosa da lesão subepitelial

Imagem 4 – Peça de mucosectomia englobando a totalidade da lesão

 

A avaliação histológica (Imagem 5) confirmou o diagnóstico obtido por ecoendoscopia por punção para além de confirmar a ressecção R0 da totalidade da lesão. O doente recuperou sem complicações e 6 meses após a exérese endoscópica não apresenta evidência clinica ou imagiológica de recidiva local ou à distância.

Imagem 5 – Avaliação histológica da peça de mucosectomia confirmando o diagnóstico de tumor neuroendócrino duodenal (aqui com marcada positividade para a somatostatina) e margens livres de lesão

 

Comentários Os somatostatinomas são tumores neuroendócrinos gastrointestinais raros e mais vezes encontrados no pâncreas do que no duodeno1, 2. A cirurgia é geralmente a opção terapêutica recomendada, contudo, estudos recentes mostram que a exérese endoscópica pode ser uma opção para os tumores pequenos e localizados3. Os somatostatinomas duodenais são geralmente assintomáticos apresentando-se mais frequentemente com sintomas locais do que por excesso de somatostatina. No presente caso, o doente apresentou-se sem qualquer sintoma gastrointestinal. Considerando o seu potencial maligno uma abordagem cirúrgica foi inicialmente considerada. Contudo, tendo em conta as comorbilidades do doente, assim como uma eventual cirurgia agressiva devido à localização do tumor, optou-se por uma abordagem menos invasiva. Nesse sentido, a ecoendoscopia ao excluir a invasão da muscular própria pelo tumor é considerada um exame essencial para confirmar a viabilidade de uma ressecção endoscópica curativa4. O presente caso é um exemplo claro da importância da ecoendoscopia, não só no diagnóstico, mas também num correcto estadiamento locoregional do tumor, o que permitiu uma ressecção endoscópica curativa da lesão. Este é um dos poucos casos descritos na literatura em que o diagnóstico e estadiamento de um somatostatinoma é feito por ecoendoscopia e a terapêutica por exérese endoscópica. Permanecem por se estabelecer em estudos clínicos de larga escala conclusões firmes referentes a este tipo de abordagem para os tumores neuroendócrinos gastrointestinais.

 

Referências 1. Čolović R, Matić S, Micev M, et al. Two synchronous somatostatinomas of the duodenum and pancreatic head in one patient. World J Gastroenterol 2009; 15(46): 5859?5863.

2. Mao C, Shah A, Hanson D, Howard J. Von Recklinghausen’s disease associated with duodenal somatostatinoma: contrast of duodenal versus pancreatic somatostatinomas. J Surg Oncol 1995;59(1):67-73.

3. Y Shozo, Takifuji K, Tani M, Kawai M, et al. Endoscopic resection of duodenal bulb neuroendocrine tumor larger than 10mm in diameter. BMC Gastroenterology 2011. 11:67.

4. Kazuya Akahoshi, Yasuaki Motomura, Masaru Kubokawa, et al. Endoscopic submucosal dissection of a rectal carcinoid tumor using grasping type scissors forceps. World J Gastroenterol 2009;15(17):2162?2165.

 

Autores Pedro Pimentel-Nunes (1), Mário Dinis Ribeiro (1), Inês Marques (2), António Pereira Coutinho (2), Analisa Ribeiro (2), Luis Afonso (1), Margarida Caldas (1), Rui Henrique (1), Beatriz Costa Neves (2), Luis Moreira-Dias (1)

1 ? Instituto Português de Oncologia do Porto (Porto, Portugal) 2 ? Hospital Pulido Valente (Lisboa, Portugal)

 

Correspondência:

Pedro Pimentel Nunes

 

Contactos autor:

Pedro Pimentel-Nunes

Al. Prof. Hernâni Monteiro, 4200-319, Porto ? PORTUGAL

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