Pesquisa

Erros comuns

Erros comuns na utilização da videocápsula endoscópica no Estudo da Patologia do Intestino Delgado

Vítor Macedo Silva, Bruno Rosa, José Cotter

Serviço de Gastrenterologia, Hospital da Senhora da Oliveira – Guimarães

ERRO #1: Não selecionar adequadamente os doentes para enteroscopia por cápsula (EC)

É importante reconhecer as indicações formais para a EC (suspeita de hemorragia digestiva média, anemia ferropénica, doença de Crohn suspeita ou conhecida, suspeita de neoplasia do intestino delgado, doença celíaca refractária, poliposes intestinais). A selecção adequada dos pacientes é fundamental no sentido de permitir um rendimento diagnóstico >=50% para lesões clinicamente relevantes, conforme preconizado pela ESGE1. Por outro lado, importa também reconhecer quais os doentes que não devem ser submetidos a EC, por apresentarem um risco acrescido de retenção da cápsula (sintomas obstrutivos, estenose luminal, antecedentes de enterectomia ou radioterapia abdominal e pélvica, consumo crónico de AINEs, entre outros).

ERRO #2: Não assegurar uma adequada preparação intestinal

A qualidade da preparação intestinal é essencial na EC, sobretudo tendo em conta que, ao contrário do que sucede noutras técnicas endoscópicas, não existe a possibilidade de optimizar as condições de visualização no decorrer do exame. Os doentes devem suspender o ferro oral durante pelo menos 5 dias, cumprir dieta de líquidos claros no dia anterior ao procedimento e 12 horas de jejum até à ingestão da cápsula. Adicionalmente, a ingestão de simeticone no início do exame, bem como a utilização de solução purgativa (preferencialmente após verificação da passagem da cápsula para o intestino delgado)2, contribuem para a qualidade da preparação e a possibilidade de identificar as lesões da mucosa.

ERRO #3: Subestimar a importância de um procedimento completo

A EC é completa quando durante o período de gravação a cápsula atinge o cego, devendo a taxa de exames incompletos ser inferior a 20%1. Um método eficaz de verificar o posicionamento da cápsula e tomar medidas que evitem exames incompletos é a monitorização em tempo real da sua passagem do estômago para o intestino delgado. Esta deve ser sistematicamente utilizada 1 hora após a ingestão da cápsula, de forma a identificar os doentes com persistência da cápsula no estômago e que beneficiam da administração adicional de procinéticos e/ou colocação da cápsula no duodeno assistida por endoscopia3.

ERRO #4: Não interpretar adequadamente os achados endoscópicos

Os achados endoscópicos devem ser enquadrados no contexto clínico do doente. Por exemplo, a detecção de úlceras ou erosões pode ser erroneamente interpretada como doença de Crohn em doentes que se encontrem a tomar AINEs. Por outro lado, é igualmente importante classificar e valorizar os achados encontrados de acordo com escalas validadas, como é o caso do score de Lewis. Também nos casos de anemia ferropénica ou suspeita de hemorragia digestiva média, é importante categorizar objectivamente os achados endoscópicos de acordo com os sistemas de classificação existentes, de modo a poder determinar o seu potencial hemorrágico e a consequente necessidade de terapêutica dirigida.

ERRO #5: Não efetuar uma correcta sistematização da leitura do vídeo e relatório final

A leitura de uma EC requer tempo e concentração. A velocidade de leitura deverá ser geralmente de 10 frames por segundo, ajustando para uma velocidade menor no intestino delgado proximal, onde é maior a ocorrência de lesões não detectadas. Esta leitura deverá ser feita idealmente sem interrupções, num ambiente calmo e com luminosidade adequada. Por fim, deverá ser elaborado um relatório detalhado, com adequada descrição e foto-documentação das lesões e sua localização estimada, recorrendo sempre que possível a terminologia standard e sistemas de classificação objectivos. Salienta-se ainda a necessidade de incluir um sumário de achados e de reportar de forma objectiva, com recurso a escala validada, a qualidade da preparação intestinal.

  1. Spada C, McNamara D, Despott EJ, et al. Performance measures for small-bowel endoscopy: A European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Quality Improvement Initiative. United European Gastroenterol J 2019;7:614-641.
  2. Xavier S, Rosa B, Monteiro S, et al. Bowel preparation for small bowel capsule endoscopy – The later, the better! Digestive and Liver Disease 2019;51:1388-1391.
  3. Cotter J, de Castro FD, Magalhaes J, et al. Finding the solution for incomplete small bowel capsule endoscopy. World J Gastrointest Endosc 2013;5:595-9.