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US Quiz of the Month – June 2013

CASE REPORT

AP, sexo masculino, 37 anos. Infecção VIH conhecida desde 1996. Actualmente sob terapêutica HAART (antirretroviral) com carga viral inferior a 20 cópias/ml e contagem de CD4 normal. Antecedentes de linfoma de Hodgkin diagnosticado em 2001. História da doença actual: Submetido em 1999 a cirurgia de exérese de quisto sacro-coccígeo. Várias drenagens de abcessos perianais em 2004, 2007 e 2008.

Em 2009 efectuada RMN que revelou: “Fístula interesfincteriana comunicando com a mucosa ano-rectal às 6h em posição de decúbito dorsal, sendo o trajecto complexo, bifurcando-se no sulco glúteo prolongando-se de forma praticamente vertical e com obliquidade posterior pelos planos adiposos nadegueiros, onde apresenta várias ramificações inflamatórias. Este trajecto comunica em topografia mediana e infra-coccígea com uma outra área de natureza inflamatória admitindo-se corresponder a complicação do quisto sacro-coccígeo não sendo o mesmo identificado em provável relação com os antecedentes terapêuticos.”

Foi submetido a drenagem de abcesso da região sacrococcígea inferior, em aparente relação com fístula perianal. A histologia foi compatível com doença pilonidal.

Em 2011 efectuado estudo complementar com ileocolonoscopia e enterografia por TAC, que não revelaram alterações.

Em 2012, por recidiva de supuração, foi submetido a nova cirurgia, constatando-se fístula interesfincteriana alta complicada de abcesso. Efectuada drenagem do abcesso e colocado seton no trajecto fistuloso encontrado. Por persistência de supuração nos meses seguintes à cirurgia, foi efectuada uma ultrassonografia endoanal de forma a reavaliar o processo supurativo.

A ultrassonografia endoanal de Março de 2013 revelou: “No canal anal médio, comissura posterior, identifica-se orificio interno em relação com fístula transesfincteriana, com trajecto descendente no quadrante postero-lateral esquerdo e que se exterioriza neste mesmo quadrante na pele perianal lateralmente à porção subcutânea do EAE. Identifica-se um trajecto secundário aparentemente supraesfincteriano, que dá origem a abcesso supra-elevador na fossa isquio-rectal direita com cerca de de 5 por 3 cm. Conclusão: Fístula transesfincteriana com trajecto secundário supraesfincteriano com abcesso supraelevador” (figuras 1 a 8).

 

 

Figuras 1 a 8: Ultrassonografia endoanal efectuada com sonda electrónica BK Medical 2052 (imagens sem e com instilação de peróxido de hidrogénio)

 

O doente foi submetido a uma última cirurgia em Maio de 2013: “Detecção de fístula anal complexa com seton, com orificio externo no quadrante posterior-esquerdo e interno ao nivel da comissura posterior; constatação de fistula anal complexa com orificio interno na comissura posterior, tipo transesfincteriana alta com múltiplos trajectos ascendentes, o principal para o espaço supraelevador e os restantes para a doença pilonidal residual.

Efectuada fistulectomia dos principais trajectos extraesfincterianos em bloco, com curetagem dos residuais; curetagem do trajecto transesfincteriano; dissecção do espaço interesfincteriano com laqueação seguida de secção da fistula o mais próximo possivel do orificio interno.”

 

Discussão:

A doença pilonidal crónica está associada à formação de fístulas, processo limitado quase exclusivamente à região sacrococcígea.

A doença pilonidal com fístula e drenagem perianal representa uma apresentação atípica que é mais susceptível de levantar uma suspeita de fístula in-ano, em vez de doença pilonidal. Quatro casos foram inicialmente relatados em 1948. A literatura mostra mais cerca de 2 dezenas de casos de doença pilonidal associada a fístula perianal, no entanto, esta situação poderá ser mais prevalente do que o reflectido pela literatura. Os relatos publicados identificaram uma predominância no sexo masculino, com uma idade média de apresentação de cerca de 25 anos. O trajecto fístuloso pode ser superficial, ou como neste caso, mais profundo e complexo com envolvimento do esfíncter.

Neste grupo de doentes, devem ser empregues os princípios para o tratamento da doença pilonidal, e adicionalmente a obliteração da fístula com preservação do esfíncter anal. Os doentes com fístula perianal devem ser submetidos a uma adequada avaliação, para caracterizar adequadamento o trajecto fistuloso, identificar abcessos associados ou doença pilonidal. Esta avaliação poderá ser feita através de um exame sob anestesia ou da realização de exames imagiológicos como a ressonância magnética ou a ultrassonografia endoanal.

 

Autores: Teresa Moreira (1), Monica Sampaio (2), Daniela Ferreira (1), Paula Lago (1), F. Castro-Poças (1)

(1) Sector de Ultrassons; Serviço de Gastrenterologia – Hospital de Santo António

(2) Serviço de Cirurgia 1 – Hospital de Santo António