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US Quiz of the Month – November 2012

CASE REPORT

Doente do sexo feminino, 60 anos de idade, com lesão quística pancreática detectada em exame ecográfico realizado após episódio de cólica renal. Realizou tomografia computorizada abdominal que identificou dilatação do canal de Wirsung condicionada por lesão mista predominantemente quística, localizada na região cefálica e recesso uncinado, com 36×25 mm. A ressonância magnética nuclear revelou marcada dilatação do canal de Wirsung em toda a sua extensão, bem como do canal de Santorini, verificando-se a presença de duas imagens canalares marcadamente dilatadas no parênquima pancreático ao nível da cabeça com terminação na ampola de Vater (figura 1). Os canais apresentavam septos e tortuosidades com imagem de atrofia pancreática. Os achados foram interpretados como manifestação de pancreatite crónica.

Figura 1: Ressonância magnética nuclear mostrando duas imagens ductais dilatadas na cabeça com terminação na ampola de Vater.

 

A doente foi submetida a ultrassonografia endoscópica que mostrou parênquima pancreático atrófico sem critérios de pancreatite crónica, canal de Wirsung marcadamente dilatado desde a ampola (8mm) até à cauda com ductos secundários (figura 2) e ducto acessório de Santorini igualmente dilatado (figura 3). O canal de Wirsung e o ducto de Santorini convergiam para lesão quística cefálica de conteúdo heterogéneo com 43 mm que se encontrava à direita, no plano e à esquerda da confluência espleno-porto-mesaraica (figura 4 e 5).

Figura 2: Canal de Wirsung (MPD) dilatado desde a ampola até à cauda com ductos secundários.

Figura 3: Ducto acessório de Santorini dilatado (5 mm).

Figura 4: Dilatação do canal de Wirsung (MPD) e do ducto acessório de Santorini (SANTOR) e ampola sem alterações.

Figura 5:O canal de Wirsung e o ducto de Santorini convergem para lesão quística cefálica de conteúdo heterogéneo com 43 mm.

Procedeu-se a punção aspirativa com agulha fina 19G (3 passagens), por via transbulbar, da lesão quística com obtenção de material de elevada viscosidade sugerindo mucina (figura 6), confirmado pela citologia (figura 7).

Figura 6: Punção aspirativa com agulha fina (19G; 3 passagens) com saída de mucina.

Figura 7: Citologia com coloração de Papanicolau (ampliação de 200x à esquerda e 400x à direita) mostrando muco e células inflamatórias.

 

Os achados ultrassonográficos demonstraram uma situação invulgar de tumor mucinoso intraductal papilar pancreático (IPMN) misto envolvendo simultaneamente o ducto principal, o canal de Santorini e ductos secundários. O IPMN constitui uma das lesões pancreáticas assintomáticas mais frequentes. Subdivide-se em três tipos: IPMN do ducto principal caracterizado por dilatação do ducto principal; IPMN do ducto secundário caracterizado por dilatação dos ductos secundários sem dilatação do canal de Wirsung; e IPMN misto, menos frequente, com características dos dois primeiros subtipos. As alterações anatomopatológicas variam entre displasia epitelial de baixo grau e carcinoma invasivo. A distinção entre IPMN do ducto principal ou do ducto secundário é importante na medida em que apresentam diferente potencial de malignização.

 

Autores: Ana Nunes1, Nuno Veloso2, Pedro Pinto-Marques1, Maria José Brito3, João Freitas1

 

1) Serviço de Gastrenterologia do Hospital Garcia de Orta, Almada

2) Serviço de Gastrenterologia do Hospital Espírito Santo, Évora

3) Serviço de Anatomia Patológica do Hospital Garcia de Orta, Almada